A primeira longa-metragem de Fern Silva é um filme-ensaio produzido no Havai, que mistura géneros cinematográficos que vão do documentário à animação, assim como temáticas que tocam a astronomia, a geologia e a etnografia. Ao explorar o que une o ser humano à natureza que o rodeia e ao cosmos que o alberga, este filme olha também para o impacto do colonialismo nessa mesma ilha
Esta história sem princípio nem fim que Fern Silva se propõe contar-nos, tem como ponto de partida a montanha mais sagrada do Havai. Dois campos opostos, duas perspectivas sobre a temporalidade também. Há aqueles que olham para as estrelas e querem construir o maior telescópio do mundo, ambicionando cartografar o sistema solar e o que está para além dele, encontrar novos mundos. E depois existem os outros, que, de forma mais modesta, pretendem preservar a sua cultura e lutam contra os novos colonizadores que querem profanar uma vez mais as suas terras, mais preocupados pelo infinito do universo do que pela ameaça real, actual e imediata que representam as torrentes de lava cuspidas dos vulcões que rodeiam a ilha. Fern Silva não toma partido, deixando a cada um a faculdade de formar a sua própria opinião, convencido que há razões dos dois lados e de que não há heróis e bandidos nesta história. O que há é uma disputa importante e, ao mesmo tempo, fútil, condicionada pela possibilidade de uma erupção, que pode apagar memórias para todo o sempre. Na terra dos surfistas, falta propósito ou finalidade. Nada mais do que pistas ténues apercebidas ao longe na crista de uma onda que pede para ser explorada, galgada e domada, como tantas páginas em branco que o espírito humano pode divagar, e perder-se infinitamente. E deste modo, inscrever na água a grandeza da sua passagem efémera pela Terra. (Mickäel Gaspar)