Bruno Dumont pega numa premissa incrivelmente operática — uma invasão do nosso planeta por forças interestelares que se representam enquanto, fundamentalmente, o Bem e o Mal —, ao mesmo tempo que a situa num local absolutamente corriqueiro: uma localidade balnear francesa onde nada de fora do comum poderia acontecer. Há espaço para sabres luz, explosões e amor proibidos e uma visão tão satírica quão divertida do apocalipse.
As reservas de imaginação de Bruno Dumont parecem ser energia inesgotável e renovável. L’Empire, vencedor do Prémio do Júri 2024 na Berlinale, procura de alguma forma repegar a estratégia de sucesso de P’tit Quinquin (2014) e a sequela Coincoin et les Z’inhumains (2018) que desconstruía o género de thriller de crime e mistério, ambientados na pacata região de Pas-de-Calais, requisitando habitantes locais para as suas personagens. Dumont percebe que a fusão entre o burlesco (ou o “tipicamente” francês) com universos codificados pelo cinema de género são fonte de comédia. Mas mais do que isso. Esta espécie de “versão gaulesa” de Star Wars acaba por levar o burlesco ao limite, como que nos dizendo que a seriedade começa somente quando racham os alicerces da verosimilhança da ficção científica e quando tudo se leva menos a sério. Talvez apenas aí o bem possa vislumbrar finalmente uma vitória contra o mal. Ou o seu contrário. (Carlos Natálio).