Um documentário cru sobre Delphine, uma jovem camaronesa que carrega uma bagagem de sofrimento que criou chifres. A câmara de Rosine Mbakam mantém-se em Delphine, sem desviar o olhar ou ilustrar o que esta conta. Nascida nos Camarões e agora sediada na Bélgica, o cinema de Mbakam, que se tem focado na experiência migrante, explora aqui temas como o peso e domínio das sociedades patriarcais sobre as mulheres africanas e a exploração sexual, colonial típica da cultura ocidental.
Uma conversa entre duas mulheres. Delphine, a protagonista, e Rosine Mbakam, a cineasta. Nascidas nos Camarões, conheceram-se na Bélgica. Separadas pela classe, elas acabam por juntar-se pela experiência migrante. Rosine segura na câmara, mas é Delphine quem aponta a sua colocação e o momento de cortar. Foi Delphine, em primeiro lugar, quem pediu a Rosine para fazer o filme. Dez dias de filmagem transformaram-se em dez anos de montagem para a cineasta. No final, ela oferece-nos um lugar de intimidade partilhada que é perfeitamente preservado. O foco está sempre no rosto de Delphine, ela fala, maquilha-se e arranja o cabelo. Ela está na sua cama. A cama às vezes está feita, às vezes não, as coisas de Delphine estão espalhadas por todo o lado. Não há necessidade de arrumar quando recebes um querido amigo. Nem o seu quarto, nem a sua alma. Daí, o lugar de intimidade partilhada torna-se um lugar de partilha de dor. A história de Delphine é a de exploração, humilhação, marginalização, e sua confissão transforma-se num grito desesperado, com uma única oração possível: mude a minha vida! A oração que não é dirigida, ao que parece, a qualquer deus, mas a cada um de nós que enfrentamos Delphine no ecrã. (Anastasia Lukovnikova)