Uma viagem surreal que começa com uma confissão de um oftalmologista e um padre que, saindo da sua igreja, é atropelado por um carro. Depois, há um purgatório medieval, criaturas grotescas e outras bizarrias.
Já quase a chegar ao final de Alegrías riojanas (uma variedade de malaguetas em conserva), uma personagem folheia as primeiras páginas de La France contre les robots, o ensaio que Georges Bernanos escreveu em 1945-46 e que é uma crítica feroz às formas de mecanização industrial, à globalização e ao império do consumo e da tecnologia. É difícil afirmar que o filme de Velasco Broca seja uma adaptação desse panfleto e nada, ou quase nada, se parece à transposição que dele fez Jean-Marie Straub. Ainda assim há aqui um mesmo desejo de refundação holística. Nesta viagem pelo inconsciente (cheia de imagens mentais), nada é estável, a começar pelo próprio filme: a ficção científica, a época medieval, o cinema de atrações, o misticismo new age e a sátira social recombinam-se em sucessivas permutações sob o peso cinéfilo de Segundo de Chomón, José Val del Omar ou Iván Zulueta. É o diabo provavelmente. (Ricardo Vieira Lisboa)