Um filme em dois momentos temporais. Em 2013, Edouard e Suzanne Mouradian vivem rodeados de ecrãs, jogos de computador e visitas dos netos. Em 2024, Suzanne está sozinha, apenas com uma relação activa com a tecnologia vigente, sejam memes de gatos ou as flutuações de bitcoin. Quando descobre uma aplicação que promete trazer Edouard de volta à (sua) vida, ela não hesita em tentar.
Depois de no ano passado termos visto a curta-metragem Frisson d’amour, Maxence Stamatiadis volta ao IndieLisboa para nos mostrar a sua primeira longa-metragem. A ideia inicial era fazer um documentário sobre os seus avós, Suzanne e Edouard, mas a morte deste último originou a transformação do projecto. Na primeira parte do filme, em 2013, assistimos ao quotidiano do casal entre aulas de yoga, babysitting à neta, rodeado de muita felicidade e ecrãs. Mas em 2024, a partida de Edouard faz com que a sua viúva, para apaziguar a saudade, recorra à aplicação Au jour d’aujourd’hui que promete trazer o seu querido marido de volta. O filme de Stamatiadis, a fazer lembrar o universo satírico de Gabriel Abrantes, é simultaneamente uma obra de ficção científica, mas também uma reflexão cómica sobre a realidade das representações e do poder da inteligência artificial e tecnologias deepfake. A utilização de imagens de arquivo de Edouard para nos mostrar a sua ressurreição tecnológica adensa a problemática do real e da cópia para o espectador. (Carlos Natálio)