FORA DE COMPETIÇÃO A terceira colaboração entre Joanna Hogg e Tilda Swinton, The Eternal Daughter poderá ser visto como uma sequela espiritual às duas partes dos seus Souvenir, mas com um cunho menos operático, embora igualmente pessoal. A história é a de uma realizadora de meia-idade acompanhada pela mãe já idosa numa estadia num hotel com uma ligação à família. Aqui, a filha pretende fazer um filme sobre a mãe e a inevitável investigação do passado revela fantasmas há muito escondidos.
Gótico, certamente. Desde as primeiras imagens (uma mansão perdida no meio de uma floresta enevoada), torna-se evidente que Eternal Daughter segue a linhagem do movimento britânico de literatura fantástica. Quando a heroína e a sua velha mãe chegam a um hotel isolado repleto de gárgulas, à boleia de um táxi um tanto anacrônico, ficamos na dúvida se não somos nós que estamos a desembarcar com elas no meio de um filme da Hammer. Neste cenário, os corredores são implacavelmente vazios e inquietantes: até a mais pequena porta teima em ranger e barulhos misteriosos parecem vir do andar de cima…. Este cenário fascinante, que temos todo o prazer em descobrir com elas, parece prestes a revelar os seus segredos mais perturbadores e subliminares.
Eternal Daughter faz uso desta combinação clássica na óptica do que, à primeira vista, nos pode parecer uma homenagem fetichista. Joanna Hogg destaca-se através de um filme de autor com uma abordagem contemporânea de realização e uma escrita bastante intimista. Neste hotel, onde são praticamente as duas únicas residentes, e como em todos os protagonistas de Hogg, desde Unrelated a The Souvenir II (Festival IndieLisboa 2022) não serão as heroínas também as intrusas? (Mickäel Gaspar)